terça-feira, 28 de maio de 2013

III - Agora sim, sou um Trailer

Com o nascer do dia ultrapassam-se os problemas colocados pela noite e pela humidade. Ver e ouvir tudo o que nos rodeia a acordar é um espectáculo formidável. O nascer do sol é outro espectáculo.




 

Vamos agora perto do casal Mota e a progressão é lenta, feita através dumas rampas, com grande dificuldade.

O PAC5, Porto Espada, ficou no Top dos PAC, por causa daquela bendita bifana!!

PAC5, Porto Espada, 08:22hrs e 49Kms

Nunca uma bifana no pão me soube tão bem como a que eu comi em Porto Espada! Pena que não houvesse mini para acompanhar e pena que o António me empurrasse trilho acima!!
Desgraçado de mim, lá fui resignado, com a bifana numa mão e com a caneca com coca-cola (!!) na outra.

Passados uma dúzia de metros já se avista o imponente castelo no alto do igualmente imponente rochedo que lhe serve de suporte. E o que ainda vamos andar para lá chegar. Quase que dava para ir a Portalegre e voltar, as curvas, sempre a subir é claro, que fizemos para lá chegar.



Um dos privilégios de se andar na cauda do pelotão é termos tempo para olhar, para ver o que nos rodeia. Para gozar aqueles quadros que a natureza nos vai oferecendo, aqui e ali, à medida que vamos subindo ... subindo e claro ... subindo!




Mas depois de muito praguejar e suar, lá transpusemos a tal porta, de conquista do castelo.

PAC6, Marvão, 10:54hrs e 60Kms

Chegando aqui, diminuem as hipóteses de desistência. É essencialmente psicológico chegar a este PAC e pensar: está (quase) feito! Falta o quase!! Faltam 40Kms!!

De imediato lanço-me sobre o 1º de 2 pratos de sopa que comi. Quente, deliciosa, retemperadora. Mais um PAC no meu TOP PAC!!

Passo sem demora aos vestiários, no 1º andar, onde opto pela muda completa. Gasto mais tempo, é certo, mas vou concerteza sentir-me melhor daqui para a frente.
Coloco entretanto o meu 'Silver' à carga e mudo calmamente de roupa.
Neste PAC só senti falta dum café, mas também não podemos ter tudo ...

Dizemos adeus ao castelo e lançamo-nos à calçada romana, 3 Kms inteirinhos dela, bem a descer! Como diria Óbelix: "   estes romanos são loucos..."! Podiam sê-lo mas sabiam fazer estradas!!
Para poupar o esqueleto e digerir a sopa, fazemos aquilo em modo passeio.


A disposição é boa. O sol começa a aquecer-nos. Estou seco e sinto-me bem.



Vamos perto dos Mota, da Célia e do Tomé, que lembro, com alguma graça, ter partido deste PAC com t-Shirt e óculos escuros. Bem havia de se arrepender lá mais para a frente!

Algures por esta fase recordo de ter comentado com o António que o pessoal do tempo se tinha felizmente enganado, uma vez que estava uma autêntica tarde de primavera! Poucos minutos mais à frente engoli esse comentário, com a 1ª das 3 cargas de granizo, com que fui premiado por tão errada premonição!

Mais à frente apanhamos a Célia que vai com campanhia, que desconheço. Observo a leveza com que se desloca. Transparece a experiência naquele conjunto atleta/equipamento. Sómente no simples movimento de beber água, gasto o triplo do tempo que ela gasta ...

Nesta fase um par de subidas bem puxadas traz-me a uma realidade que desconhecia, por inexperiência pura. Os tempos e os andamentos dum trail, com estas características, nada têm a ver com o que eu estou habituado.
Arredondando, traduzo 10Kms = 1hr. Aqui, em Portalegre, aprendi a traduzir 10kms = 2hrs!!

A disposição e o ânimo sofreram aqui um forte abalo. Tal como na minha viagem anual a Runa, é igualmente por volta dos 60/70Kms que atravesso maiores dificuldades.

Aquelas subidas, ainda com pavimento romano, trouxeram o espectro da desistência, perante a falha física que senti entre Marvão e Carreiras. Não sei se devido à moleza provocada pela sopa, se ao facto das temperaturas terem subido significativamente, ou se devido ao acréscimo de energia necessária para transpor aqueles obstáculos, esta foi realmente uma fase difícil.

Estas subidas trazem-me à realidade do andamento possível que faço. 5Kms por Hora é realmente a verdade que estou a apreender.

Vamos os 4 em silêncio e calculo que não esteja a passar dificuldades sózinho. Se fosse nesta fase sózinho não sei o que faria.

Faço contas e embora pareçam pouco os cerca de 25Kms que faltam, isso em tempo corresponde a qualquer coisa a rondar as 5horas!! Mais, claro, os tempos de paragem nos PAC.

Feitas assim as contas um gajo fica mesmo desanimado!

Felizmente chegamos ao PAC7.

PAC7, Carreiras, 13:20hrs e 70Kms

Neste PAC brilhou uma equipa de colaboradores, que a cerca de 100mts do PAC distribuíam minis. Aqueles 200ml souberam muito bem e reconstituíram. Logo à frente o complemento, aqui constituído por biscoitos e coca-cola. Mais uns mimos.

O ânimo está de novo em cima.

Arrancamos em direcção a Castelo de Vide.

É tempo de gestão!

Como o Carlos Fonseca me transmitira no último encontro, num Ultra Treino em Sintra, tudo se resume a "Gestão do Esforço". Nesta fase lembrei-me dessas palavras.

PAC8, Castelo de Vide, 14:39hrs e 77Kms

Perto deste PAC cai nova carga de granizo. É extraordinária a tarefa daquele elemento da organização que sózinho, num entroncamento e a 250mts do PAC, orienta o pessoal em direcção a este. Deverá ter ali estado várias horas, sózinho, ao frio e à chuva! O pessoal dos PAC sempre estavam acompanhados. Este esteve ali sózinho e por isso aqui deixo o meu reconhecimento.

Estou encharcado!

Faço o rapel, à La Rambo de Queijas, seguido do controlo e um chá quente para retemperar.

A esposa do António dá apoio e o Tomé está um pouco desorientado, encharcado,  de t-shirt e óculos de sol!!
Acho alguma graça, ao contrário do que ele terá achado na altura. Não o veremos mais e desconheço se terá ido para a frente ou se pelo contrário, ficou mais para trás.

Neste PAC a chuva cai com alguma intensidade e o pessoal vai-se juntando debaixo do toldo, que obviamente é pequeno para tanta gente. Optamos por arrancar.

Estou todo molhado e vamos em direcção ao PAC9.

É uma boa altura para correr, estradões em bom estado e poucas subidas.

Fazemos contas e se não houver azar chegamos ainda de dia, o que claro, é o que mais queremos.

Estou mais animado e nesta fase, se fosse sózinho, teria corrido mais vezes. Aqui foi de grande utilidade a experiência do António, que me segurou. Claro que muito provavelmente pagaria mais à frente esse gasto suplementar de energia naquela fase.

Mesmo faltando 'apenas' cerca de 15Kms, estaremos a cerca de 3horas de chegar a Portalegre.

Chegamos ao PAC9 que juntamente com os PAC5 e PAC6 constituiu os 3 no TOP dos PAC.

PAC9, Castelo Provença, 16:40hrs e 89Kms

A estrela aqui foi a Pizza. Devo ter comido algumas 5/6 porções. Era como se não houvesse amanhã. Pena estar de chuva porque o local merecia uma paragem um pouco maior.

Finalmente o António arrastou-me dali, para alívio do pessoal do PAC, que via a pizza a diminuir a olhos vistos!

O ânimo está em cima. À medida que lentamente os Kms vão passando, diminuiem as hipóteses de desistência. Vamos agora por montes, vales, cercas e valados, em direcção ao último PAC.

Passamos por elementos da organização que nos dizem "faltam 6 a subir e 4 a descer"!

Logo à frente, outro elemento informa "faltam 14kms (!!!)" e isto cai como gelo na nossa animação!!

Ficamos desanimados e muito chateados.

Devia haver um pouco mais de rigor neste tipo de informação prestada. Para mais estaríamos perto do Km90º de 100 e onde 4Kms significam cerca de 40'!!

Valeu um 3º elemento, que passados pouco metros, noutro cruzamento, desempatou e garantiu-nos "faltam 10Kms!!"



Chegamos ao PAC10 e o sol brilha!

PAC10, Penha, 17:52hrs e 95Kms

Estamos perto das 18hrs de viagem. Dão uma mini e fazemos um brinde: "à próxima que esta está feita!!"

O António muda de camisola e penteia-se!?

Perante a minha cara, esclarece que " é para o Photo Finish "!!  O que vou eu dizer a isto??

Estou eu a deliciar-me com a preciosa mini, quando o António me diz que para fazer o mesmo tempo que em 2012, teríamos de fazer os últimos 4Kms a 6'/Km. Duvido que consiga e ponho-o à vontade para se adiantar. Engulo o precioso néctar e arrancamos, escadas abaixo.

Estamos de volta ao alcatrão e o ritmo sobe. Há muito que o 'Silver' teve um AVC fatal e guio-me pelo andamento do António, que calculo ronde os 05:30/Km.
Entusiasmo-me e adianto-me, viro-me e ele vem mesmo atrás de mim.
Ando o que na altura me pareceu uma eternidade e estou sempre à espera de ver o estádio. Chego a uma passagem, controlada pela organização, onde me dizem "suba esse muro, ande até à ponta e depois salte para o chão!!" Analisando superficialmente mais este obstáculo, sorrio para o meu interlocutor e das instruções que ele mecanicamente me transmite.
O muro tem cerca de 30cms de largura, por 5mts de comprimento e 1,5mts de altura. O equilibrismo ainda consigo, mas o salto, provavelmente, iria soltar-me todas as articulações e tendões que ainda estivessem em condições naquela altura e por isso, transpus pelos meios que consegui arranjar, recorrendo mesmo ao traseiro e aos joelhos.

Depois deste suplício, olho para trás e nada de António!!

Mas onde é que ele se meteu??

Continuo mas a passo mais lento, esperando dar-lhe tempo para me apanhar, o que felizmente acontece. Reagrupamos a cerca de 250mts do estádio e entramos lado a lado.

Faltam menos de 400mts para acabar e por momentos esqueço todas as dificuldade e todos os receios e gozo aqueles últimos momentos duma aventura da qual espero recordar-me durante muito tempo.

Terminamos lado a lado uma aventura que vivemos lado a lado, nas anteriores 18horas.

Corto a meta e está terminado o Ultra-Trail da Serra de São Mamede, edição de 2013.

170º, 18:38:12hrs

Depois do tal Photo Finish, gentilmente obtido pela esposa do António, dirijo-me para dentro.

Sinto aqui alguma pena de não poder contar com qualquer presença no local, mas sei que à distância os meus Filhos seguiram a m/aventura.

Sei também que o meu habitual dispensador de adrenalina, sob a forma de sms, está a acompanhar-me desde a 1ª hora. Obrigado Jorge.

Obrigado a eles, pelo apoio constante e incondicional que me deram.

Obrigado ao António, que conseguiu puxar por mim quando eu precisava e conseguiu conter-me quando precisava.

Estou muito contente, mas só penso em meter-me debaixo do duche. Vou recolher o saco e dirijo-me ao 1º balneário que encontro. Lá dentro um espanhol olha desolado para os pés. Olho e fico desolado também. Os pés daquele menino estavam uma lástima!! A única coisa que tenho é vaselina, que ofereço meio envergonhado. O rapaz agradece mas o que ele precisava mesma, naquela altura, era de uma carrinho, para o levar dali para fora.

Faço um rápido check up e estou impecável. Nada mesmo. Nem uma bolha, nem uma assadura. Bendita da vaselina que faz e fará sempre parte dos meus packs de viagem!!

Tomo banho vestido, para aproveitar o 2 em 1 e dar já uma enxaguadela à roupa. Vou de seguida para o jantar, que não deixa saudades e está concluída a minha viagem a Portalegre, de 2013.

Estou pronto para a próxima.

Venha a próxima!!


... // ...


Passados alguns dias desta aventura, no decurso duma viagem de comboio para o meu serviço, escrevi a seguinte mensagem no meu telemóvel:

"THE DAY AFTER
Nada melhor para o ego do que acordar na manhã seguinte a ter feito 100Kms!
É uma sensação anti-tróika, que nos coloca nos píncaros.
Não fosse sentir as pernas pesadas e iria já para o vale do jamor, fazer 45' calmos.
Venha a próxima"

segunda-feira, 27 de maio de 2013

II - Agora sim, sou um Trailer!

Cheguei a Portalegre e ao local da partida perto das 23:00hrs, já com uma camada de nervos daquelas...

As cerca de 3hrs de viagem permitiram-me um flashback nas minhas memórias e no meu caminho até ali, a Portalegre.

Tudo começou há cerca de 25 anos, com um desafio para cumprir os cerca de 21,097mts, na Nazaré. Pouco tempo depois e com a frescura dos meus vintes, foi o desafio dos míticos 42,195mts, na Maratona Spiridon, em Cascais.

Depois, vários anos mais tarde e já no início dos meus cinquentas, no meu 'nascimento' para o Trail, veio o concretizar do sonho do 'ultra', entendido como desafio superior aos 42,195mts.

Há cerca de 2 anos, devido a motivos da minha vida, vieram os 100,000mts.

No passado dia 18, em Portalegre, cumpri outro sonho, fazer uma prova de trail com 100,000mts.

Consegui!!

Portalegre surgiu como hipótese privilegiada, em 2012, quando no Fórum da Corrida, li rasgados elogios à qualidade da prova e à qualidade da organização.

Era o mínimo que poderia e deveria fazer, assegurar-me que haveria boas hipóteses de correrem bem os factores que não dependessem directamente de mim, ou seja, assegurar-me que no aspecto organizativo não seriam colocados quaisquer obstáculos à minha prestação.

Consegui!!

Depois de um ano passado, depois de alguns treinos, umas 'baldas' e algumas provas, eis que estou chegado ao 17 de Maio de 2013.

As últimas semanas não foram pacíficas.

A desistência no Ultra de Sesimbra não augurava nada de bom. Aliás, aquela prova foi um desastre do ponto de vista desportivo, o oposto do que eu fizera um ano antes.

Porque 2013 não tem sido um ano especialmente produtivo em termos de carga de treinos, muitas dúvidas se colocavam à minha capacidade em aguentar tal empreendimento.

À medida que os dias em falta iam diminuindo, crescia a angústia sobre se deveria ou não embarcar nesta aventura.

Passou-me muitas vezes pela cabeça desistir e adiar a viagem a Portalegre por um ano.

Nas vésperas da tão esperada e ao mesmo tempo temida sexta feira, no último treino que fiz, 3 dias antes, senti-me pesado, sem força e por isso profundamente desanimado.

Mas a natureza humana tem destas coisas, o medo transforma-se, supera-se e pensa-se "logo se vê"!!

Ali, em Portalegre, rapidamente me dirigi ao secretariado para recolher o dorsal (M44), de volta ao carro, ainda deu para beber um café numa roulote. Olhei para o relógio e fiquei mais descansado, faltavam ainda cerca de 60' para a partida.

Mais calmo equipei-me, como tantas vezes o fiz, embora lá no fundo, o nó no estômago me lembrasse, de vez em quando, que tinha pela frente 100Kms de pura montanha, num Trail classificado como  "Difícil"  e que concede 3 pontos aos finishers e candidatos ao Mont Blanc!!

Nos últimos dias as condições atmosféricas alteraram-se. As temperaturas baixaram significativamente e a chuva regressou.

Aqui foi um ponto a meu favor: temperaturas baixas e chuva!

  • Às 10:30 dirigi-me ao 'cadafalso'.
  • Às 10:40 fiz o check-in.
  • Às 10:45 estava no estádio, onde tudo iria começar e com muita esperança minha, acabar!
Muitas caras conhecidas. O Francisco Monte que ia fazer a estreia (e que estreia seria ...) nos 100Kms rumo ao Mont Blanc. O Joaquim Adelino, o Luís 'Tigre' Miguel, o Jorge Serrazina, o António Almeida, o Carlos Couto e muitos outros.
Sente-se ali um ambiente diferente da generalidade das provas a que estou habituado.

Não há grandes manifestações, há um clima de alguma tensão. Todos os segundos são aproveitados para ver e rever todos os aspectos no equipamento.

Troquei algumas palavras com o Francisco, desejei-lhe uma boa prova e alguns minutos depois era a partida.

E de súbito cerca de 300 almas são largadas no escuro, para os trilhos que nos separam de estar de volta a este mesmo estádio donde saíamos agora, em passo curto.

Como meio de me auxiliar a controlar o meu esforço e sempre com a Arrábida no pensamento, procurei o Joaquim Adelino.

Ele era repetente, conhecia por isso o traçado e o passo dele, como já pude comprovar em diversas ocasiões que andei ao seu lado, assemelha-se muito ao que eu precisava naquele início de prova.

Alguns Kms à frente encontrei-o. Ia acompanhado pelo Luís Miguel e juntei-me a eles. O que planeei seria fazer com eles a 1ª metade da prova, ver como me sentia nessa altura e depois decidir qual a táctica mais aconselhável nessa altura.

As minhas 'balizas' eram:
  • Pac3 em 07:00hrs
  • Pac6 em 14:30hrs
  • Pac9 em 21:45hrs
Se eu desistisse por falta de pernas, assumia tal limitação e voltava costas. Agora era impensável para mim ser afastado da prova por atingir algum destes PAC fora dos horários definidos.


Há o 1º curso de água e a 1ª cena digna de registo.
Um grupo de 4 espanhóis, todos equipados a rigor e com os bastões da moda. Mas os rapazes estavam com pouca vontade de molhar os pés e a certa altura, sobre as pedras no riacho, a fazer equilibrismo e atrás dos tais espanhóis, vejo as pontas de 2 bastões à frente dos olhos e assusto-me. O sujeito em vez de usar aquilo para se apoiar, estava a usar aquilo para me espetar!!
Desviei-me, atirei-me para a água e adeus espanhóis!!

Os trajectos entre PAC nesta altura são feitos quase em silêncio. Tudo está ainda muito no início. Ainda há muitos Kms pela frente e a noite propicía a algum recolhimento.

Escrevi na altura no tlm.: "1ª hora com 7Kms"
Tinha sido um trajecto acessível, tirando talvez o facto da longa fila que gerou aquele curso de água, com muita gente a querer esquivar-se à água.



No PAC1 - Viveiro (11Kms) ainda vou com o Joaquim e com o Luís. Foram 11Kms para aquecer sem nunca ferver!!

Alguns pedaços de banana e ala, para não arrefecer.

Passados 7Kms, no PAC2 - Alegrete, deliciei-me com tostas acompanhadas com marmelada, naquele coreto de difícil acesso.

Pac2 = 02:27hrs

Neste ponto do traçado mais uma cena digna de registo. Vamos ainda os 4, agora sei que o 4º elemento e que eu não conhecia era a Susana Brás. Aqui ajudo o Joaquim a vestir o corta-vento. Com mais a ajuda do Luís, andamos ali os três à procura  do capucho daquilo. Com 'apenas' 17Kms, já não dávamos com aquilo!!

Está frio e começa aqui o ataque às antenas e ao PAC3.

Escrevi na altura no tlm.: "3ª hora com 19,5Kms. Mais vento e frio. Venho com o Luís e o Joaquim aí atrás"

Adianto-me um pouco, embora nunca nos afastemos muito uns dos outros.

Ando aqui alguns Kms com o Tomé, do Mundo da Corrida. Faz-se silêncio naquela caravana. Tudo no escuro, tudo a passo e concentrado na tarefa que temos pela frente.

Mais umas notas no tlm.: "Vou agora sózinho. Elevação em 950mts. Está muito frio. Mãos e nariz gelados. 4hrs e 26Kms"

Pac3 = 04:54hrs

Adiantei-me um pouco e chego ás Antenas sózinho. PAC3 - Antenas. Está muito frio e muito vento. Uma bancada e um toldo, no meio do nada constitui o PAC3. Alguns elementos embrulhados em cobertores. Faço o controlo, peço um café, agarro em 2 queques e vou para dentro dum contentor, que felizmente alguém abandonou ali. Vários concorrentes vão desistir aqui. Hipotermia! Estarão a sentir o mesmo que eu senti há umas semanas atrás, em Sesimbra.

Escrevi na altura: "5hrs e 30Kms. Nas antenas os 1ºs abandonos. Estou gelado mas sinto-me bem. Sigo agora o Antº Almª. O ambiente aqui em cima é de fugir ..."

Vejo entretanto o António Almeida a arrancar e arranco com ele. Sei que em 2012 ele e o Joaquim andaram grande parte do percurso juntos, é por isso outro candidato para ser 'agarrado'. Sei por outro lado que o Joaquim tem a companhia do Luís, por isso vou à procura da minha.

"Apreciem agora estes 900mts de single track"  está escrito num placard no início duma descida, logo ali à saída do PAC3. Devo confessar que não apreciei nem 1mt daquele single track!!

O nevoeiro dissipava a luz do meu frontal, o frio fazia os meus olhos lacrimejarem e por isso foram 900mts sempre na expectativa duma queda, porque mal conseguia ver o caminho.

Felizmente, um pouco mais à frente começa a nascer o dia. Acompanhado pelo António encontramos o casal de 'lebres' Mota, com quem andaremos durante uns Kms.





Percorremos agora numa zona muito bonita e o nascer do sol é espectacular. É a Barragem da Apartadura, a nossa próxima paragem e final de viagem para mais uns quantos, que desistem ali.

Pac4 = 06:53hrs

Como pão com marmelada e coca-cola. Alguns minutos de intervalo e seguimos caminho, rumo ao PAC5.

sábado, 25 de maio de 2013

I - Agora sim, sou um Trailer!

Na quinta-feira, passado dia 16 de Maio, estava prestes a embarcar naquela que certamente representou a minha maior aventura em termos desportivos: a realização dum Trail com cerca de 100Kms.

A ideia de o fazer vinha já do ano passado, após Runa e os 100Kms que fiz.

Os relatos sobre a edição de 2012 e a qualidade outorgada à Organização, ajudaram à decisão que seria em Portalegre o local para a minha estreia (ou tentativa) de chegar aos 3 dígitos em Trail.

No nascer do ano novo, ataquei e fiz de imediato a minha inscrição.

De lá para cá muita coisa aconteceu, mas a ideia tomou forma gradualmente, começou a andar comigo, gradualmente à medida que o calendário avançava.

Um ultra treino em Sintra, a edição 'pirata' do Fim da Europa, Runa e Arrábida, foram os eventos de 2013, até chegar a São Mamede.

Dias atrás comprei um frontal Black Diamond que substituirá o do chinês que comprei há uns anos para a Pirata de Monsanto. Comprei a Manta de Sobrevivência, que com o apito que recebi em São João das Lampas completou o cabaz dos artigos obrigatórios definidos pela Organização.

Os treinos, esses foram fracos. De facto a preguiça não me dá apenas para a escrita, apanhou-me também outras funções. Treinos dispersos e na sua maioria desadequados para uma actividade daquelas.

Fiz o treino em Sintra, onde contei de início com a preciosa companhia do Francisco Monte e depois, mais à frente, com a do experiente Carlos Fonseca.

Deste recordaria, durante todo o tempo que decorreu até Portalegre, que tudo se resumia a Gestão de Esforço, quando o assunto eram eventos longos, tal como eu pretendia fazer em Portalegre.

A esta distância, acabo por lhe dar inteira razão.

Fiz Runa, claro, num passo sempre confortável porque ali pouco interessa se corro ou não, mas na Arrábida, em Abril, levei com um Reprovado, a encarnado carregado. Não passei dos 30Kms.
Razão: falta de pernas!!

Depois foi cerca de um mês a tentar à pressa arranjá-las. As pernas!!

Voltando à quinta-feira, dia 16, com que comecei este relato, confidencio-vos que passei o dia a imaginar que no dia seguinte estaria todo o dia a correr, em Portalegre e arredores.

Levantei-me e a essa hora estaria no dia seguinte a correr, há 7 horas!
Almoçei e a essa hora, no dia seguinte estaria a correr, há 13 horas!
Saí do serviço e apanhei o comboio para casa e imaginei que no dia seguinte, a essa hora estaria a correr há 18 horas!

Com o equipamento todo dividido e pronto eram 20:00hrs quando arranquei em direcção a Portalegre.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

A (des)ordem das coisas.

Pensei um pouco agora que tenho 3 artigos para partilhar convosco.

Tenho andado preguiçoso, essa é a verdade.

Escrevi parte do relato da minha jornada de 2013 a Runa e ficou por ali.

Agora que venho de Portalegre, pensei se seria mais correcto manter alguma ordem cronológica, por força da qual o relato que deveria ser agora publicado seria aquele que descreve a minha ida a Runa, representando este evento o que para mim tem mais importância no ano.

Seguindo nessa ordem seguir-se-ia o relato da minha ida a São João das Lampas, fazer a estreia dos Trilhos do Fernando Andrade e finalmente a minha aventura e igualmente estreia no Ultra-Trail em São Mamede.

Se todos os relatos são importantes para mim, porque tenho gosto em partilhar convosco as minhas aventuras, tb não é menos verdade que quanto mais atrasar a publicação destes artigos no meu blog, mas desactualizados eles ficam e temo perder seguidores (...).

Acabei por me decidir em baralhar as coisas e publicar o evento que tenho mais fresco na memória e depois publicar os outros dois.

Runa porque o devo ao que partilharam esta minha jornada, à minha Família e ao grande Jorge Branco e o dos Trilhos apenas porque quero.

Obrigado a vocês por continuarem a dar-me o prazer das vossas visitas.